Balada para D.Quixote

Um olhar de viajante na última carruagem do último combóio de uma Memória intemporal.

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A generalidade daquilo que você (e eu) julgamos saber, pode estar errado, porque, em regra, assenta em «informação» com falta de rigor e imparcialidade, vinda de quem interessa formatar a nossa mente. Pense você mesmo! Eu faço-o!

2.4.09

Desemprego: À Espera de Godot


“Nada a fazer”. “Godot não virá hoje, talvez amanhã...”.
As palavras escritas por Samuel Beckett, ocorrem-me nesta conjuntura social em que a palavra “desemprego” se ouve e lê por todo o lado. E, talvez não nos apercebamos de que, de alguma forma, estão todos – economistas, Estados, incluídos – à “Espera de Godot”, para este nos devolver o “emprego” desaparecido.

O povo refere que há uma maneira de dizer e várias de entender. É o que se passa, por exemplo, com “emprego”. É uma palavra que tem o significado que tem, mas que, de modo algum, possui a abrangência suficiente para ser o sinónimo de “trabalho”. O emprego tem uma forte componente laboral, mas que não esgota todas as outras múltiplas formas do trabalho produtivo. Daí resulta imediatamente uma primeira falsa interpretação das normas do Direito que existem para regular e proteger o trabalho.

Não há, assegurado, um direito ao emprego pela mesma razão lógica de que o não pode haver igualmente para a empresa que o utiliza. Logo, o direito ao emprego, é realmente uma abstracção comum ao rol de boas intenções dos sindicatos; produz bom efeito visual quando escrito em faixas durante as manifestações de rua, mas não passa disso. De algo apenas virtual.

Há sim instituído, um direito ao trabalho. Só que este direito tem que ser interpretado de forma rigorosa. O seu cumprimento pressupõe apenas, que a todos é garantido o acesso ao mercado de trabalho e que cada um é livre de exercer a profissão que entender desde que esta esteja conforme com a lei geral. Só por uma interpretação distorcida e fantasiosa se poderia imaginar que, para assegurar o direito ao trabalho, o Estado fosse empregar todos os trabalhadores cuja ofício, especialidade ou aptidão laboral não fosse absorvida normalmente pelas empresas e pelo mercado de trabalho.

Compete sempre ao trabalhador vender essa sua aptidão, saber, conhecimento ou ofício, ao mercado supostamente “comprador” dos serviços de trabalhadores com uma arte ou saber específicos.

Cada qual pode fazê-lo de forma directa como trabalhador “independente”, ou de forma indirecta como trabalhador “dependente” – alienando nesta situação, durante um determinado período temporal, em troca de um salário -, o exclusivo do seu trabalho, a uma empresa, cuja hierarquia integra, a qual adquiriu o direito de o controlar laboralmente, e de lhe estabelecer metas de produção e normas de procedimento; se essa empresa não é o Estado, o trabalhador dependente -, agora na situação de “empregado”- fica ligado às contingências da empresa e do seu mercado, à sua evolução tecnológica e, em função de algumas delas, até admitir como possível, a dispensabilidade potencial da aptidão laboral que deu origem à sua integração na unidade de produção.

A escolha de uma profissão, ou em mais rigor, a escolha de um quadro de especializações profissionais polivalentes, nunca foi tão complexa como hoje. Durante mais de um século, várias gerações puderam trabalhar sob o mesmo tecto, para a mesma empresa, durante toda a sua vida. Hoje as coisas já não são assim. As pessoas, ao longo da sua vida laboral útil, vão ter que conhecer, muitas empresas, desempenhar profissões variadas, trabalharem mais e ganharem relativamente menos do que os seus pais e avós.

Portanto a reclamação sindical de um “emprego estável”, “com direitos” para todos (o que pressupõe a proibição da sua extinção unilateral), onde seja vedada por lei a rotatividade laboral, só é exequível internamente, isto é quando os sindicalistas, olham para o seu umbigo e o seu próprio emprego, e esquecem que já nada os liga ao mundo laboral que um dia abandonaram para seguir a carreira de sindicalistas profissionais. Quanto aos outros trabalhadores, mesmo os que pagam quotas aos sindicatos, ainda vão ter que aguardar muito por esse idílico mundo de trabalho. Até que Godot venha, num amanhã improvável!

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