Balada para D.Quixote

Um olhar de viajante na última carruagem do último combóio de uma Memória intemporal.

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A generalidade daquilo que você (e eu) julgamos saber, pode estar errado, porque, em regra, assenta em «informação» com falta de rigor e imparcialidade, vinda de quem interessa formatar a nossa mente. Pense você mesmo! Eu faço-o!

15.3.07

Cravos e "Cromos" do Abril 74 (2)


Uma Tarde na Assembleia da Republica


"Fora com o Galvão!" - era a caixa do jornal República daquele dia de Agôsto de 1975. O prestigioso jornal, agora ocupado pela extrema-esquerda, tinha-se entretanto transformado em tablóide revolucionário. Qualquer rumor era notícia. O alvo para esse dia, era o General Galvão de Melo, membro da Junta de Salvação Nacional que tomou o poder a seguir ao golpe militar de Abril de 74, e que entretanto tinha sido eleito como deputado independente pelo CDS. Esse artigo do República foi o suficiente para Américo Duarte, o solitário deputado da UDP e representante no Hemiciclo da extrema-esquerda, entrar em acção, apresentando ao Plenário um requerimento:
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Que o Governo investigue do artigo vindo no jornal República, onde vêm declarações proferidas por Galvão de Melo, que passo a transcrever: "Galvão de Melo possuía cópias dos arquivos da ex-PIDE/DGS guardadas em duas embaixadas.
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Ainda o requerimento estava quente quando o secretário da mesa anuncia: - Há ainda outro requerimento do Deputado da UDP que, requer que a Mesa ponha imediatamente à votação desta Assembleia a expulsão do Deputado do CDS Galvão de Melo (risos).
Continua o secretário: A Mesa não aceita este requerimento, apenas leu as suas conclusões, para melhor informação desta Assembleia..."
Américo Duarte: Fora o fascista do Galvão de Melo!
O Secretário: (...) a Mesa, em rigoroso cumprimento desse Regimento ...
Américo Duarte: A Mesa é fascista!
O Secretário: ... não aceita o requerimento. O Senhor deputado pode recorrer ...
Américo Duarte: O recurso dá-o o povo!" (risos).
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Algum tempo depois, Américo Duarte pede novamente a palavra: Perante as provocações e infâmias que o fascista Galvão de Melo para aqui tem feito contra as posições defendidas pela UDP nesta Assembleia Constituinte, (...) Não é a fascistas ou a reaccionários e traidores que eu reconheço o poder de me julgarem. Só a classe operária, a que pertenço, e o povo trabalhador deste País (...) Nós sabemos que esse senhor apareceu ligado ao golpe do 11 de Março, (...) também no 28 de Setembro esse senhor foi apanhado no Sheraton, (...) e afirma que o golpe de 11 de Março foi urdido pela extrema esquerda. Esse fascista, está a encobrir e desculpar o colonial-fascista Spinola e pior do que isso, - passamos a ler uma notícia vinda na República, de 16 de Agosto de 1975: - Bronzeando-se na piscina do Hotel Atlântico ... (risos)
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Américo Duarte: ... o general Galvão de Melo, afirmou poder provar as suas afirmações, proferidas na Assembleia Constituinte, acerca do Deputado da UDP (nota do editor - referência ao requerimento para que a Assembleia investigasse se o Deputado da UDP tinha, em tempos, sido informador da polícia política), pois possuía cópias dos arquivos da exPIDE/DGS guardadas em duas embaixadas estrangeiras.
Segundo esta notícia do República, este senhor, além de todas as acções fascistas, roubou documentos que pertencem ao Estado Português e ao povo português.
Este senhor falou quando os seus chefes o mandaram intervir, para que ele aparecesse neste momento, em que os fascistas levantam a cabeça, fazem actos terroristas e querem acabar com as conquistas já alcançadas pelo povo português.
Os fascistas actuam hoje em Portugal para que voltemos ao 24 de Abril. Daqui alertamos as massas populares para que, não nos deixando dividir pelos inimigos do povo, avancemos numa ofensiva popular contra o fascismo, gritando bem alto:
Morte ao fascismo e a quem o apoiar! Mais queria dizer a UDP. Daqui, da Assembleia burguesa e fascista, convoca todos... (apupos e assobios).
Américo Duarte: ... todos os operários e camponeses... (agitação na sala).
Américo Duarte: ... todos os soldados e marinheiros, todos os trabalhadores e antifascistas anti-imperialistas. (apupos).
Américo Duarte: Temos vindo a assistir nas últimas semanas a uma escalada violenta dos fascistas.
O Presidente: "Eu chamo a atenção do Sr. Deputado, para que modere um pouco as suas expressões (...) para não obrigar a Mesa a ver-se obrigada a cortar-lhe a palavra.
Américo Duarte, ignorando: Queria alertar todos os operários e camponeses, todos os soldados e marinheiros, todos os trabalhadores antifascistas e anti-imperialistas (...). Contra o fascismo, contra o capital. Ofensiva popular. Contra os imperialismos- independência nacional. Contra as superpotências- unidade com o Terceiro Mundo. Vivam - os camponeses, irmãos dos operários. Fim aos latifúndios e à exploração dos camponeses. Fim à miséria dos camponeses. Operários e camponeses, soldados e marinheiros, unidos venceremos. Soldados sempre, sempre ao lado do povo. Dissolução da Constituinte, já! (apupos, grande agitação na sala, manifestações nas galerias)
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O presidente da Assembleia avisa mais uma vez que as galerias não se podem manifestar. Américo Duarte contesta: Eu só queria dizer que o povo que lá está em cima é aquele que paga para estes senhores estarem aqui em baixo. (vozes: "Qual povo?" Aplausos das galerias. Agitação na Sala).
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O Presidente: O Sr. Deputado Américo Duarte não tem necessidade de seguir esse caminho. Peço-lhe, que ajude a presidência na boa ordem e no bom seguimento destes trabalhos.
Américo Duarte continua como se não tivesse nada a ver com o assunto: Por tudo isto convidamos todos os operários, camponeses, soldados e marinheiros, sargentos e oficiais progressistas e todos os trabalhadores antifascistas e anti-imperialistas a integrarem-se na manifestação unitária antifascista e anti-imperialista a realizar na próxima (...) Morte ao fascismo. As comissões de moradores e de ocupantes: Casal Ventoso, Alto da Eira, Vale Escuro (...) As comissões de trabalhadores: Applied, LNEC. (aplausos do Sr. Deputado Galvão de Melo. Risos.).
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Galvão de Melo pode a palavra: Sr. Presidente, Srs. Deputados. A opinião que faço do nosso distintíssimo colega da UDP já todos a conhecem e não vale a pena repetir. Em todo o caso, eu só queria deixar aqui uma pequena nota. É que, ao referir-se a uma notícia que viria num determinado jornal sobre o facto de me ter estado a bronzear numa determinada piscina, que estive a bronzear-me, não se pode negar - porque se vê ... (risos, apupos, agitação na sala)

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