Balada para D.Quixote

Um olhar de viajante na última carruagem do último combóio de uma Memória intemporal.

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A generalidade daquilo que você (e eu) julgamos saber, pode estar errado, porque, em regra, assenta em «informação» com falta de rigor e imparcialidade, vinda de quem interessa formatar a nossa mente. Pense você mesmo! Eu faço-o!

13.3.07

Cravos e "Cromos" do Abril 74 (1)





Ser ou Não Ser

Informador da PIDE



14 de Agosto de 1975. O deputado da UDP (extrema-esquerda) Américo Duarte, faz mais um dos seus discursos em que distribuia insultos a eito.
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Américo Duarte: O povo trabalhador de Portugal vive hoje um dos momentos mais difíceis da sua luta desde o 25 de Abril. Os fascistas levantam a cabeça e estão em plena escalada no Centro e Norte do País. O assassino Spínola já dá entrevistas à BBC, onde diz que lutará, citamos, «em todos os campos e por todas as formas», nós sublinhamos «por todas as formas», por aquilo a que chama a libertação de um povo." (Agitação na Assembleia).
Américo Duarte: Este colonial-fascista, assassino dos povos irmãos das colónias e assassino do povo português fez até ameaças veladas de guerra civil em Portugal, a exemplo, também, do Sr. Galvão de Melo.
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O discurso prosseguiu com insultos e acusações da mesma estirpe, aos imperialistas americanos e os sociais-imperialistas russos e aos lacaios de Cunhal. Alguns minutos mais tarde, Galvão de Melo, o general que fizera parte da Junta de Salvação Nacional e que era agora deputado do CDS
, pediu a palavra para ler um requerimento:
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Galvão de Melo: Vou ler um requerimento que acabei de entregar na Mesa; Já por repetidas vezes o nosso distintíssimo colega Sr. Américo Duarte, Deputado pela UDP, aqui proferiu criticas pessoais visando directamente Deputados de todos os restantes partidos, eu próprio, e, certa vez, nem o Movimento das Forças Armadas escapou, ao ser «atacado» um dos seus membros: o Sr. Tenente Judas, presidente da comissão de desmantelamento da Direcção-Geral de Segurança (DGS). Estes «ataques», que o nosso distintíssimo colega não pensou nem escreveu e tão-somente nos leu o melhor que pôde (risos), só não são insultantes por virem de quem vêm; só não são insultantes porque aquele que os proferiu é o primeiro a não compreender (risos).
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Estes desabafos, para além de simples divergência política, revelam um nervosismo e uma raiva incutida que começa a ser suspeita. Revelam medo! Medo de quê? O excesso de agressividade é sempre revelador de um sentimento de medo. Ora, tenho verificado que a agressividade do Sr. Américo Duarte explode com violência impressionante sempre que, directa ou indirectamente, vem ao caso mencionar a antiga Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE), que mais tarde passou a designar-se por Direcção-Geral de Segurança. Porquê esta preocupação tão específica? Será que com o seu vozear tonitruante o Sr. Américo Duarte pretende abafar algum prurido de consciência antiga? Será que o Sr. Américo Duarte, ou alguém que por trás dele se esconde, ou na frente se mostra (risos), tenha, de qualquer modo, tido ligações profissionais com a polícia que durante meio século foi sustentáculo da ditadura derrubada em 25 de Abril? De facto, possui o Sr. Américo Duarte duas características que, bem aproveitadas, teriam feito de si um informador por excelência de qualquer polícia política: Obediência de autómato; Ousadia em declarar o que não sabe.
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Tendo em conta as considerações expostas, e ao abrigo do artigo 6.º, n.º 9.º, e artigo 12.º, n.º 1, alínea a), do Regimento, requeiro ao Presidente deste Assembleia que use de todos os meios ao seu dispor para esclarecer os duzentos e cinquenta. membros desta Assembleia, representantes do povo de Portugal, aqui reunidos, sobre esta grave dúvida: foi ou não o Sr. Américo Duarte informador da PIDE/DGS?
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Após as gargalhadas e bastante burburinho, a sessão prosseguiu. Mais tarde, no período da ordem do dia, Américo Duarte manifestou a sua indignação com uma declaração de protesto que foi lida pelo secretário da mesa da Assembleia:
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"Declaração de protesto ao Presidente e de alerta ao povo português:
1.º O Sr. Galvão de Melo acabou de lançar uma provocação ao povo português
(risos), quando, depois de fazer um discurso reaccionário, perguntou a certa altura «de que é que se esperava?», na clara intenção de perguntar às forças reaccionárias se não seria esta a altura de lançar um golpe fascista;
2.º Esse senhor, não contente com isso, faz um requerimento atacando a posição da UDP, representada nesta Assembleia, lançando provocações e calúnias que não são tomadas por uma afronta pessoal, mas a tentativa de uma provocacão generalizada às massas populares;" (Aplausos e manifestações das galerias).
3.º A UDP apresentou nesta Assembleia, perante a Comissão de Verificação de Poderes, o pedido de averiguação das ligações anteriores dos Deputados, em especial de Galvão de Melo - que tanto no 28 de Setembro como no 11 de Março apareceu embrulhado nos golpes com forças fascistas;
4.º Para nós, as duas intervenções desse senhor feitas hoje, mostram bem o levantar de cabeça do fascismo, perante o qual o povo tem de estar preparado para responder, e mais do que isso, que o Sr. Deputado Galvão de Melo está disposto a passar das palavras aos actos, ou seja ser a cabeça e o corpo de um novo golpe fascista, como afirmou a um jornal espanhol. Daqui alertamos as massas populares para estarem vigilantes e unidas, de forma a esmagar o avanço fascista."
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Galvão de Melo pede a palavra: Sr. Presidente, Srs. Deputados: ...
(Manifestações nas galerias).
Américo Duarte abandona a Sala e de caminho grita para Galvão de Melo: "Hás-de ir parar ao Campo Pequeno!"



[Nota do editor: O Campo Pequeno é a Praça de Touros de Lisboa. "Meter os Fascistas no Campo Pequeno" tinha sido uma alusão de Otelo Saraiva de Carvalho feita perante a imprensa, durante esse verão de 1975, num momento de grande euforia revolucionária, quando regressava de uma visita à Cuba comunista. Aí, fora recebido como herói da "revolução" portuguesa, uma espécie de réplica europeia do lendário Che Guevara; o próprio Fidel Castro presenteara-o com uma metralhadora pessoal.
Encurralar adversários políticos dentro de praças de touros tinha antecedentes próximos, que Otelo deveria conhecer, ocorridos recentemente no Chille, por ocasião da revolução que derrubou Allende, e outros mais remotos, como os da Guerra Civil de Espanha (1936-39). Estes encerramento de adversários em praças de touros, tiveram também desfechos de diferentes gravidade. Na Praça de Touros de Badajoz ocorreram vários fuzilamentos.]



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