Balada para D.Quixote

Um olhar de viajante na última carruagem do último combóio de uma Memória intemporal.

A minha foto
Nome:
Localização: Covilhã, Portugal

A generalidade daquilo que você (e eu) julgamos saber, pode estar errado, porque, em regra, assenta em «informação» com falta de rigor e imparcialidade, vinda de quem interessa formatar a nossa mente. Pense você mesmo! Eu faço-o!

22.12.06

Testemunhas do Século XX




José Hermano Saraiva (entrevista)


Como é que o Estado Novo chegou a sua casa? - Não tenho uma ideia muito clara disso. Recordo-me de que o 28 de Maio - lembro-me dos cabeçalhos dos jornais - aparece como uma libertação de um período de anarquia, de tumulto, como o tempo dos bombistas. Havia uma revolução constantemente. As pessoas estavam muito fartas, concretamente dos partidos. Quando se ouviam três tiros de canhão dados do Castelo de S. Jorge isso queria dizer "metam-se em casa que vai haver uma revolução". É um período de anarquia militar terrível que só acaba com o Estado Novo. Fiquei em Lisboa a estudar, acabei por tirar dois cursos, de Letras e de Direito, e fui presidente da Associação Académica de Letras.

Que fazia então a Associação Académica? - Fazia tudo quanto queria. Fazia bailes, festas, a queima das fitas, peças de teatro. Essa lenda de um mundo abafado perfeitamente imaginada agora por organismos de propaganda. Eu não senti isso... eu era, aliás, contra aquele regime, achava que devia haver liberdade, e assinei as listas da oposição. Eram listas que diziam que as eleições deviam ter mais garantias e ser fiscalizadas, eu assinei tudo isso e nunca ninguém me fez mal por isso. A minha mulher também. Nunca vi directamente esses fantasmas de terror de que agora falam.

Mas houve pessoas perseguidas, presas, deportadas, por serem da oposição? - Falava-se com muito terror dos bolchevistas. Era uma coisa de que toda a gente tinha muito medo. Mas a grande maioria da população não queria os partidos, só queria uma coisa: ordem. Ordem para fazer os seus negócios. E o Estado Novo deu-lhes essa ordem. Tudo isto vem até aos anos 50. Depois da II Guerra Mundial há uma revalorização dos regimes democráticos que após a I Guerra só tinham sobrevivido nas nações com uma burguesia extremamente forte e bem organizada, como a França e a Inglaterra. O dr. Salazar foi forçado, em grande parte pela opinião internacional, a fazer eleições. Mas não permitiu a reconstituição dos partidos. Fez eleições sem partidos. É claro que as ganhou.

Eleições sérias teriam posto em causa o regime? - Estou absolutamente convencido de que não. O prestígio do dr. Salazar era imenso. Era considerado o salvador da Nação. A pequena burguesia progrediu, instalou-se, transforma-se numa média burguesia que não admite as limitações impostas pela ordem, quer liberdade, partidos, imprensa livre, eleições. Foi o que o dr. Marcelo Caetano tentou ao fazer eleições que creio, traduzem a verdade. Havia instruções terminantes do Governo, posso garantir, para não haver fraudes, nem falcatruas, nem viciação de dados. Só que havia outro problema que as eleições não discutiam - o problema do Ultramar. Muita gente estava na guerra. E não há ninguém que goste de estar na guerra, a guerra é uma coisa muito má. E é isso que provoca um golpe militar que retira o poder ao dr. Marcelo Caetano e o dá a uma equipa de militares.
Continua …

Sinopse. Entrevista ao jornal O Público

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial