Balada para D.Quixote

Um olhar de viajante na última carruagem do último combóio de uma Memória intemporal.

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Localização: Covilhã, Portugal

A generalidade daquilo que você (e eu) julgamos saber, pode estar errado, porque, em regra, assenta em «informação» com falta de rigor e imparcialidade, vinda de quem interessa formatar a nossa mente. Pense você mesmo! Eu faço-o!

9.8.07

Requiem Para um Assassino


(...) a senhora estava grávida e não havia maneira de morrer, a lâmina da catana abria-lhe o corpo mas, sabe-se lá porquê, não morria. Estava grávida, e ele (o capataz negro contratado no Bié e que – como reconhece mais tarde - até nem tem razão de queixa dos brancos. Dona Eugénia, trata-o muito bem. Come com ele na cozinha e confia-lhe os dois filhos) teve que acabar o serviço com a enxada. – «Mulher grávida tem duas vidas, é mais difícil de morrer.» - Os pequenos, esses não levantaram problemas, nem choraram. Levanta-os pelo pescoço, lançando-os ao ar, quando caem rebentam no cimento…

Um dos grandes assassinos em massa da história do século XX e principal mentor da carnificina de oito mil portugueses em Angola (1961), morreu de doença prolongada a 8 de Agosto. Chamava-se Holden Roberto.

Embora politicamente morto há muito tempo, no país do Presidente-Rei Eduardo dos Santos e da sua luxuosa corte de familiares e amigos, a oficialmente designada por República de Angola, ainda ali se ouviram alguns discretos elogios ao dito percursor da luta pela independência.

Até o inefável político português Almeida Santos, responsável pelas colónias na altura – um advogado que enriqueceu em África não se sabe rigorosamente como, que agora assume poses de Senador, - achou conveniente esquecer o massacre e homenageia o falecido, dizendo que “não era mal intencionado…”. Destas boas intenções certamente não é o céu que está cheio.
Uma nota: ao que julgo saber, só um jornal português – o Diário de Notícias – recordou com uma fotografia o massacre de Angola e a responsabilidade de Holden.

Se Holden foi o mentor, a matança teve o apoio moral e material do então Senador dos EUA J.F.Kennedy, que, no vernáculo de um refugiado angolano que conheci – “levou um tiro nos cornos” em 1963 – e nas palavras do General Kaulza de Arriaga, “deveria ter sido morto quatro anos antes para não ter havido o massacre”. Com 34 anos de diferença, o tempo acabou por fazer justiça. Que os mortos enterrem os seus mortos.

O que resta é História. A 15 de Março de 1961, bandos armados da UPA de Holden Roberto, destruiram fazendas e vilas e assassinaram dois mil colonos brancos e seis mil negros. Foi o início de uma insurreição armada em Angola contra o regime colonial português que viria a durar 14 anos. Arriada a bandeira portuguesa pela última vez na ex-colónia, outra, agora entre angolanos, mais cruel e violenta ainda, começaria então.

«(...) Holden Roberto embarcara dias antes para os EUA. O massacre estava concertado para o mesmo dia em que, na Assembleia das Nações Unidas, a Libéria apresentava uma moção de censura contra Portugal.»

«(...) Dois mil europeus e seis mil trabalhadores bailundos tinham sido mortos. Em NY uma estação de TV mostra imagens da tragédia. Holden, em frente ao televisor, assusta-se com o resultado das suas ordens. Confessaria mais tarde: - Vi homens esquartejados, crianças retalhadas e mulheres violadas. Estava no meio de brancos e não tive coragem de reivindicar a acção

(...) numa das fazendas, encontram o dono, Manuel de Matos, atado a uma árvore, sem cabeça e sem mãos. Ao lado o corpo nu da mulher com um pau no sexo, do filho quase nada sobrava, tinha sido assado e comido (...) Um homem tinha os testículos na boca, a mulher estava toda retalhada e, numa alcofa, um recém nascido cortado em cinco postas»
O texto em itálico, foi retirado de um trabalho de Felícia Cabrita para o semanário Expresso de 14 de Março de 1998.

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